Dentro dos conteúdos relacionados ao Outubro Rosa, é importante falarmos sobre os genes conhecidos pela sigla BRCA (do inglês BReast CAncer susceptibility), que têm relação com a ocorrência de câncer de mama e ovário. Estes têm a função biológica de atuar no organismo como supressores tumorais. Ou seja, sua ação natural na produção de proteínas específicas evita o surgimento de neoplasias.
No entanto, quando ocorrem alguns tipos de mutações, especialmente nas variantes genéticas denominadas 1 e 2 (daí o nome BRCA1 e BRCA2), perde-se essa ação supressora, ou seja, há uma susceptibilidade ao desenvolvimento de alguns tipos de câncer.
Para esclarecer melhor este assunto, conversamos com o cirurgião oncológico e coordenador do Grupo de Tumores Ginecológicos do Centro de Oncologia do Paraná, Dr. William Castelleins. Confira!
- As mutações BRCA1 e BRCA2 elevam as chances de quais tipos de tumores?
Nem todas as mutações genéticas levam a tumores. Elas precisam ocorrer em certas posições dentro do gene, que é um fragmento curto do DNA. Por isso, as mutações identificadas como deletérias dos genes BRCA1 e BRCA2, aumentam a chance do desenvolvimento de câncer de mama (também em homens) e ovário.
Poucas pessoas sabem, mas também elevam o risco de câncer nas trompas uterinas, endométrio, próstata e pâncreas. Além destes, diversos estudos estão em andamento para determinar a relação destes genes com câncer colorretal, estômago, trato biliar e melanoma.
- No caso das mulheres que possuem a síndrome, quais são as condutas médicas realizadas?
Quando um teste genético em uma mulher que teve câncer de mama ou ovário revela a mutação em BRCA, tanto ela quanto suas filhas e irmãs devem passar por um aconselhamento genético. Na consulta com o médico geneticista, será analisado o risco para o desenvolvimento de novos eventos, resultando em recomendações únicas para aquela paciente, dentro de um contexto biológico, familiar e pessoal. Assim, em algumas situações, podem ser indicadas a realização de mastectomia total e ooforectomia (retirada dos ovários) profiláticas.
É importante mostrarmos alguns dados científicos quanto aos números para estes riscos. A variação do risco de câncer de mama em portadoras da mutação em BRCA1 até os 70 anos de idade é de 55-70% e entre 45-70% em portadoras de BRCA2. Para câncer de ovário, o risco ao longo da vida é de 40-45% em portadoras de BRCA1 e 15-20% em BRCA2. Porém, sabemos que o risco de câncer de ovário antes dos 40 anos é baixo 1.
Apesar destes dados, é fundamental lembrar que a grande maioria destas neoplasias ocorrem de forma esporádica, sendo que apenas 6% dos cânceres de mama e 20% de ovário, têm bases hereditárias 2.
1 Risks of Breast, Ovarian, and Contralateral Breast Cancer for BRCA1 and BRCA2 Mutation Carriers. JAMA. 2017;317(23):2402.
2 Genetic Testing and Results in a Population-Based Cohort of Breast Cancer Patients and Ovarian Cancer Patients. J Clin Oncol. 2019;37(15):1305
- Quais pacientes são candidatas a avaliar se têm a síndrome?
Deve-se testar em uma família a pessoa em que existe a maior chance de se encontrar as mutações patogênicas destes genes, ou seja, mulher afetada por câncer de mama em idade jovem (abaixo de 40 anos) ou por câncer de ovário em qualquer idade. Recomenda-se que as filhas destas mulheres também sejam testadas, à procura de mutações. Em todos os casos, uma consulta de aconselhamento genético com geneticista é fundamental no esclarecimento de dúvidas e indicação dos exames.
- Qual a relação entre câncer de mama e ovário?
Devido às mutações de BRCA aumentarem a chance câncer-específica para mama e ovário, usa-se na terminologia médica relacioná-las como Síndrome do Câncer de Mama e Ovário Hereditário3. Sabendo que as mesmas variações mutagênicas afetam os dois órgãos, é fácil entender que podem acontecer, na mesma mulher, os dois tipos de câncer, mesmo que em momentos diferentes da vida.
Da mesma forma, existe a possibilidade do câncer de mama, em sua história natural de disseminação, ser encontrado sob a forma de metástase nos ovários.
3 New name for breast-cancer syndrome could help to save lives. Nature. 2019;571(7763):27.
- Qual a importância da ooforectomia para as mulheres com a síndrome ou que já tiveram câncer de mama?
Discute-se muito a respeito da retirada preventiva dos ovários em mulheres que tiveram câncer de mama ou são portadores das mutações, a chamada salpingo-ooforectomia bilateral redutora de risco4. O objetivo é evitar a ocorrência de câncer de ovário, para as mulheres com alto risco de desenvolvê-lo.
Porém, quando a mulher não deseja ser submetida a este procedimento, recomenda-se que sejam avaliadas a cada 6 ou 12 meses com ecografia pélvica e dosagem do marcador CA 125 sanguíneo. Para portadores das mutações filhas de mães que tiveram câncer de mama, esse acompanhamento deve iniciar aos 35 anos ou 10 anos antes da idade em que a mãe foi afetada.
4 Should women with familial ovarian cancer undergo prophylactic oophorectomy? Obstet Gynecol. 1992;80(4):700.
7) O câncer de mama pode gerar metástases no ovário, mas o câncer de ovário também pode gerar metástases na mama?
A resposta é sim. Apesar de não ser uma ocorrência habitual, há alguns relatos de caso na literatura médica mundial recente, reportando este fato.5,6,7
5 Breast metastasis from ovarian cancer: A case report. Radiol Case Rep. 2018;13(6):1166-1169.
6 Ovarian Cancer Metastasis to the Breast: A Case Report and Review of the Literature Case Rep Oncol 2020;13:1317–1324
7 Metastasis of Ovarian Cancer to Breast: A Case Report and Review of Imaging Manifestations. Cancer Management and Research 2020:12 13015–13021.
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